A questão do trabalho aqui começa a preocupar logo assim que se chega, quando você só gasta e vê suas economias dando tchau, mas quando se tem um planejamento e controle dos gastos dá pra saber até onde se pode ir. Pra gente, trabalho teria que fazer parte da nossa rotina mais cedo ou mais tarde, por razoes financeiras bem óbvias; mas com a condiçao de que fosse sempre compatível com os nossos planos de estudos. Isso porque pelo menos nos primeiros anos em que estivermos aqui, só trabalhar nao foi e ainda nao faz parte de nossas estratégias. Sendo assim, fomos atrás de algo que nos desse flexibilidade de horário. Sem medo de ir a luta e cair dentro do tal subemprego, que alguns brasileiros costumam denominar. Isto é um fato que já estavamos dispostos e preparados mesmo antes de sair do Brasil, arrumar uma labuta depois de devidamente instalados. Nossa idealizaçao de instabilidade financeira e profissional aqui nao é a curto prazo, mas sim a médio e longo prazo e por isso acho que temos traçado um caminho certo, indo devagar mas por um caminho sólido, porque nao queremos lá na frente ter que voltar e fazer algo que deveríamos fazer agora no início (estudar!). Quem pode se dar ao luxo de só estudar, ótimo, embora eu veja tb desvantagens dentro desta expectativa, mas de qualquer forma este nao era o nosso caso. Encaramos um trampo, ecomizamos um dinheiro, gastamos muito também... rsrsrs e nao nos arrependemos e nem temos vergonha de nossas ecolhas. Realmente ganho menos aqui do que no Brasil, mas vivo muito melhor do que vivia lá.
Aqui em Québec, percebo que se você está disposto a fazer qualquer coisa não vai te faltar emprego nao. Hoje tenho absoluta certeza de que fizemos muito bem em ter escolhido esta cidade para recomeçar a vida. Além de ser um lugar lindo e bom pra se viver, trabalho nao falta, desde que você tenha paciência e disposiçao.
Na mesma época, o Rogério estava trabalhando no restaurante dos idosos como plongeur (lavava as louças) o que permitia equilibrar o orçamento familiar e para ele também estudar francês. O que aconteceu depois? Quando chegou em jan/fev a oferta de mao de obra diminuiu consideravelmente e as horas de trabalho tb e ele acabava só trabalhando umas 3x por semana, sendo 2 delas no fim de semana. Vimos isso acontecer com muita gente e ainda bem que isto nao dura muito tempo nao. Lembrando que aqui ganhamos por hora. Foi aí que surgiu uma oportunidade, indicaçao de uma amigo, para trabalhar num restaurante bem conhecido aqui como aide-cuisinier (ajudante de cozinha). Caiu como luva, porque ele nao trabalharia final de semana, poderia continuar na francisaçao, o salário hora era maior do que no outro restaurante, além de ser bem menos cansativo. Ajudante de cozinha nao é igual no Brasil que faz tudo nao, aqui as tarefas sao bem divididas. Neste restaurante as tarefas consistem basicamente em preparar os alimentos para os cozinheiros no dia seguinte. Cortar legumes, frutas, verduras, separar em porçoes... O ambiente de trabalho neste restaurante é bem agradável e os brasileiros sao super bem vindos. Graças ao primeiro brasileiros que trabalhou lá e abriu as portas para os outros. A rotatividade dos brasileiros acaba sendo grande porque o pessoal fica lá enquanto estuda, faz francisaçao ou equivalências de diplomas, e volta e meia surgi oportunidades para quem esta chegando e/ou precisando. Pode parecer menos glamouroso do que trabalhar em um loja, mas além de ser menos cansativo ainda se ganha mais, disso tenho vivência para falar, como verao a seguir.
Continuando. Com esta nova oportunidade, o Rogério pediu dispensa do restaurante dos idosos, mas ficou trabalhando lá até o "ex-chefe" dele conseguir colocar alguém no lugar, mas se colocou a disposiçao, caso ele precisasse muito de alguém exporadicamente. Já que o cara tb tem um buffet e muitas das vezes que tem eventos na cidade ele é o resposável por prepar a comelância. Tem sido assim até o dia de hoje. O Rogério é uma espécie de coringa para ele, quanda aperta ou precisa cobrir alguém, ele dá uma ligadinha e pergunta se o Rogéerio esta disponivel, quando esta disponível e afim de trabalhar vai, e quando nao esta diz que nao vai e nem por isso o carinha fica com raiva dele ou coisas do tipo. Quando estava de férias na francisaçao, por exemplo, o Rogério trabalhou alguns dias lá cobrindo as férias de um outro funcionário, mas pediu na escala alguns dias de folga e finais de semana, que prontamente foram concedidas. Afinal, viemos pra cá pra ter qualidade de vida e tempo de lazer ou pra ficar de bobeira em casa pra gente é primordial, nem que seja o mínimo, já que no Brasil até o mínimo era dificil.
Como a demanda de mao de obra no inverno (mais em janeiro e fevereiro) caiu muito, cheguei a ficar preocupada de como seria este processo no verao, quando os estudantes entram de férias e vao todos procurar trabalhos temporários em shoppings, restaurantes, comércio e etc. No entanto, quando verao chegou percebi que tinha demanda e vaga pra todo mundo e eu acabei podendo escolher o que queria fazer durante o verao.
Após ter terminado o curso de francês da ULaval, precisava trazer renda pra casa e dessa vez me sentia mais preparada para trabalhar em alguma coisa dentro da minha área de formaçao. Cheguei a pensar a participar do programa PRIIME do emploi québec, recebi a carta de recomendaçao, fiz um excelente contato com uma instituiçao que estava interessada em me empregar, mas acabei desistindo porque neste programa eu tinha que fazer um contrato de pelo menos 6 meses de trabalho e eu nao poderia voltar aos estudos na sessao de outono (no final de agosto). Como o mestrado na minha vida já estava mais do que decidido, desisti dessa história de trabalho na minha área naquele momento. Além disso, estava com a cabeça voltada para o meu projeto de pesquisa que eu tinha um prazo para entregar (condiçao para admissao), além de um curso de ingles que tinha começado. No entanto, ainda precisando de dim dim e nao podendo deixar o maridao sobrecarregado com essa tarefa precisava pensar numa estratégia para levra renda pra dentro de casa. Foi aí que o restaurante onde o Rogério trabalha estava precisando de mais pessoas no verao como aide-cuisinier e eu me candidatei para engrossar o time. Nao ia de segunda a sexta nao, ia umas 3 ou 4x por semana e fazia umas 5/6hs de trabalho por dia, o que dava para eu conciliar com outras atividades da vida diária...hehehe. No entanto, volta e meia eu ainda dava uma olhadinha no emploi-québec para ver se tinha alguma vaga que correspondia as minhas expectativas, que naquela altura do campeonato eu já tinha aumentado o meu nível de exigência, já que estava bem satisfeita com o meu empreguinho temporário no restaurante. Vi muitas oportunidades pra trabalhar como intervenante social com uma clientela bem diversificada em suas opçoes, porém, eu nao queria trabalhar de madrugada, nem fins de semana, queria ganhar mais ou pelo menos a mesma coisa que do que eu ganhava no restaurante, um contrato de trabalho que me permitisse voltar a estudar na sessao de outono e que fosse na área que eu mais gostava. Parecia impossível achar minha vaga com tantos pré-requisitos que eu coloquei aos meus empregadores, né? rsrsrs Nem tanto! Para Deus, realmente nada é impossível, se isso fosse o melhor para mim eu saberia que a oportunidade iria surgir.
Ao contrário do que ouvia falar sobre a dificuldade de conseguir trabalho por nao ter uma experiência canandense, isso no meu caso nao interferiu em nada, pois a minha experiência profissional no Brasil foi considerada, valorizada e definitiva para a minha contrataçao aqui. Palavras dos que me contrataram. Nao tirei nada do meu CV, inclusive o período em que trabalhei aqui em loja.
Sobre o francês ideal... Quando acabei o curso na ULaval no final de abril, achei que ele estava tinindo! Hoje tenho consciência de que o francês ideal só daqui há uns pelo menos 3 anos de Québec. rsrsrs Leva tempo...muito tempo, mas isto é algo que tb já nao me inquieta mais...
Minha grande dificuldade sempre foi a compreensao oral, pricipalmente com todo este sotaque québécois o qual nao estamos acostumados. Costumo dizer que se minha chefe soubesse que no início eu entendia metade das coisas que ela falava, nao teria me contratado. Penso o seguinte, fiz uma entrevista, se o empregador me contratou com este francês que tenho a apresentar, entao voilá!...rsrsrs
Por outro lado, o meu instrumento de trabalho é a linguagem. Preciso falar bem, compreender bem e escrever bem. Sem dúvida nenhuma, trabalhar numa loja ou num restaurante era bem mais facil neste sentido. Agora eu trabalhava dentro de minha área de formaçao, isso tinha um peso pra mim e mais ainda porque trabalhava com pessoas que falavam de sentimentos, emoçoes, conflitos, coisas com e/ou sem sentido e todas as suas abstraçoes e concretudes. Precisava ter uma escuta atentiva, desenvoltura e atençao para as mil e uma coisas que aconteciam ao meu redor ao mesmo tempo. Participar das assembléias com os usuários, passeios, reunioes de equipe, estudos de caso, atendimento telefônico e individual. Nada muito diferente do que eu já fiz no Brasil, se nao tivesse a questao da língua. Os atendimentos individuais e as escutas telefônicas eram sempre mais fáceis, afinal naquele momento eu tinha ouvidos só para uma pessoa... hehehe. Eram quase 8hs por dia de falaçao, na primeira semana quase enlouqueci, a vontade que tinha era de sair da unidade dar um berro na rua e voltar. O cansaço mental era tao grande que o trabalho no restaurante ficou ainda mais moleza do que já era pra mim antes. Uma verdadeira loucura! No entanto, por ser uma área de trabalho que eu gosto, dentro do processo de cuidado que eu acredito, o fardo acabava sendo mais leve. Além de ter sido mais um desafio que vivemos aqui, foi uma grande experiência pessoal, profissional, para o meu francês e também para o meu mestrado.
"Grandes realizações são possíveis quando se dá importância aos pequenos começos."
( Lao Tzu )